Histórico e conceito do Transtorno do Espectro Autista (TEA)
O tema Autismo movimenta pesquisas em várias áreas do conhecimento, e adquire cada vez mais relevância no âmbito social. Estudos apontam crescimento na prevalência de pessoas com TEA nos últimos anos, e isso se deve ao aumento no acesso aos serviços de diagnóstico, por maior esclarecimento da população, menos estigma e maior disponibilidade de serviços. Mas será que estamos caminhando para a construção de uma sociedade cada vez mais inclusiva?
De acordo com o mais recente relatório do Centro de Controle de Prevenção e Doenças (CDC), divulgado em 2021, com dados observados em 2018, 1 em cada 44 crianças é autista. O Censo Escolar realizado pelo Inep (Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) mostrou recorde no número de matrículas de estudantes com deficiência nas escolas comuns, tendo passado de 46,8% em 2007 para 87% em 2019.
Sabe-se que o Transtorno do Espectro do Autismo, é caracterizado por uma condição que afeta o desenvolvimento neurológico, ou seja, algumas funções neurológicas não se desenvolvem como deveriam nas respectivas áreas cerebrais. As manifestações que caracterizam seu contexto sintomático, são relacionadas à dificuldade na interação social e na comunicação, além de padrões de comportamento repetitivos e estereotipados.
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), divide o TEA em nível 1, 2 ou 3, que faz referência ao suporte e intervenção que a pessoa com autismo precisa receber. No nível 1, o sujeito apresenta comportamentos mais funcionais e exige pouco apoio. No nível 2, há menor grau de autonomia e necessita de algum auxílio em atividades cotidianas. Já no nível 3, o paciente é mais dependente e precisa de um suporte substancial.
A palavra “espectro” remete justamente a uma infinita possibilidade de características, pois cada indivíduo apresenta comportamentos singulares em maior ou menor grau, de forma conjunta ou isolada das demais características e comorbidades. Dificuldade para dormir, é uma característica muito presente no autismo, assim como seletividade alimentar, medos excessivos e hipersensibilidade a determinados barulhos ou estímulos.
Se torna evidente que a manifestação do autismo é heterogênea, ou seja, não é possível uma criança ser igual a outra, pois cada uma delas possui perfis diferentes, déficits e habilidades distintas. Por isso, os alunos com autismo são um desafio ao educador. Além de ser uma criança que exige uma proposta interventiva individualizada, exige atenção e estratégias diversificadas. Portanto, as instituições de ensino precisam estar atentas às necessidades do autista, buscando assegurar um trabalho educativo e adaptado para atender às necessidades educacionais desses alunos.
Desafios da inclusão na escola
A declaração universal de direitos humanos afirma que “todo ser humano tem direito à educação” (ONU, 1948), isso de maneira prática inclui a pessoa com qualquer dificuldade ou limitação a estar inserida na escola, a ter atividades e atuações voltadas a seu desenvolvimento nas diferentes esferas, sendo a escola uma participante ativa neste processo.
Embora se configure como direito e dever, sabe-se que a inclusão da pessoa com deficiência no ambiente escolar ainda é um desafio. Como antes exposto, percebe-se um aumento significativo da matrícula de crianças com deficiências em escolas regulares, o que representa um grande ganho, mas exige a preparação adequada do ambiente, e dos profissionais.
O atendimento educacional especializado (AEE) ajuda a garantir a inclusão, na medida em que oferece um aprendizado de conhecimentos, técnicas, utilização de recursos informatizados, e tudo que difere dos currículos acadêmicos que ele aprenderá nas salas de aula das escolas comuns. Mazzotta (2003) diz que a formação de professores do ensino regular precisa ser retomada, para torná-los capazes de desenvolver uma educação inclusiva para atender a todos.
De diferentes maneiras, muitas vezes as ações que seriam necessárias para que essa inclusão ocorra, não acontecem de maneira efetiva. Tal problemática é reafirmada quando nos referimos à criança dentro do espectro autista que enfrentam obstáculos como dificuldades de matrícula, preconceito de colegas, professores sem formação adequada e falta de uma perspectiva mais inclusiva por parte dos gestores.
Quando, no entanto, a escola não proporciona recursos suficientes à criança, torna-se um ambiente desfavorável ao seu desenvolvimento e à aquisição de novas habilidades. Além de reforçar estigmas e preconceitos em relação à pessoa com deficiência, intensificando o sofrimento da criança e da família. O que acontece, muitas das vezes, é que a educação tem como foco integrar ao invés de incluir (Camargo e Bosa, 2009).
Embora os conceitos sejam usualmente tidos como sinônimos, há uma importante diferença na vida da criança autista. Enquanto integrar, na prática, significa trazer essa criança para o espaço comum, há uma tendência de adaptá-la à escola e às demais crianças. Muito contrário disso, a inclusão não refere-se em apenas ter a criança no mesmo espaço que as demais, mas a proporcionar à ela as mesmas experiências das demais crianças, sendo que, nessa percepção, é a escola que se adequa às necessidades da criança, e não o contrário.
Foto1 – Integração X Inclusão (Portal de Educação)
Como buscar a inclusão na escola?
Partindo do pressuposto de que a oferta de educação é uma garantia de direitos, é importante nos envolvermos e estarmos atualizados das políticas públicas e legislações, voltadas à pessoa com deficiência, de maneira a garantir que haja ações e práticas que garantam a efetividade da inclusão.
Sabe-se ainda, que a capacitação dos professores e o perfil de gestão da escola, atuam como fortes influentes no processo de inclusão dessa criança (Camargo e Barbosa, 2009), e por isso se torna ainda mais importante que haja contato e participação da família ao longo desse processo.
Fala-se então, de uma tríade no atendimento à criança autista, sendo sustentada pela equipe – família – escola. Apenas assim, pode-se garantir que os esforços e empenhos de uma parte ressoam na outra, que gera, em última instância, melhoras significativas em diferentes áreas do desenvolvimento da criança. Dessa forma, as trocas devem ser recíprocas, e visar as necessidades e potenciais da criança no âmbito familiar, escolar e integral.
Deve-se objetivar ainda, que a escola seja um espaço físico, social e inclusivo, sendo que a efetivação de um ambiente inclusivo é descrito por Sassaki (1997, p. 39) como “a remoção de barreiras que impedem a plena participação das pessoas deficientes em todas estas áreas, permitindo-lhes assim alcançar uma qualidade de vida igual à de outras pessoas”.
Assim, a escola deve se ater às legislações e buscar ações que fortaleçam a perspectiva de inclusão social, promovendo ações de conscientização e informação à comunidade escolar (alunos, famílias, equipe). Ainda capacitando professores e demais integrantes da equipe para que possam se adequar às necessidades da criança, remover obstáculos para o seu desenvolvimento, almejando a quebra de paradigmas e preconceitos. Bem como visar a autonomia deste indivíduo, além de almejar, sobretudo, a aprendizagem e o desenvolvimento das habilidades e potencialidades.
Conclusão
Dessa forma, pode-se concluir o quanto a escola exerce um papel fundamental na inclusão e desenvolvimento da criança autista. Todo aluno, independente das dificuldades, poderá beneficiar-se dos programas educacionais. Porém, é crucial que este ambiente esteja adequado para não apenas receber alunos com deficiências, mas que proporcione a eles oportunidade de desenvolvimento e crescimento dentro de suas potencialidades.
Ativamente, os atores inseridos no processo de educação, professores, equipe, estudantes, familiares, precisam se responsabilizar e engajar-se em atitudes e ações que tenham como objetivo a garantia dos direitos de educação à criança diagnosticada com o Transtorno do Espectro Autistas. No entanto, é necessário conhecer o desenvolvimento humano, e suas relações com o processo de ensino-aprendizagem, levando em conta como se dá este processo para cada aluno.
Faz–se fundamental ainda, uma comunicação e atuação em rede, integrando educação e saúde para melhor acompanhamento da criança, de maneira integral, a considerar seus contextos, dificuldades e competências. Pode-se ainda afirmar que, o objetivo deve ser uma educação humanizada, que valoriza a criança como foco da aprendizagem, e fundamenta uma atuação mais inclusiva.
Somente dessa forma, pode-se impulsionar a aprendizagem de habilidades de grupo, o brincar compartilhado, a comunicação, e interação, além de alcançar objetivos pedagógicos. Por fim, esse indivíduo necessita estar inserido em um ambiente onde haja instrumentos suficientes para um desenvolvimento pleno, dentro de sua singularidade. Que a escola se torne esse local de promoção e conscientização acerca do tema, e seja responsável por romper com estigmas, preconceitos e tabus acerca do TEA e demais deficiências.
Referências
ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA. Manual de diagnóstico e estatística de distúrbios mentais (DSM IV). São Paulo: Manole. 3ª ed.,1994. Disponível em: http://www.ama.org.br/html/info_faqu. php. Acesso em 20/10/2019.
BRASIL. Lei Federal nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 28 dez. 2012.
Camargo, S. P. H. C. & Bosa, C. (2009). A. COMPETÊNCIA SOCIAL, INCLUSÃO ESCOLAR E AUTISMO: REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA. Psicologia e Sociedade 21 (1). 65 -74. Ferreira, Fabiana Ribas, Carvalho, Maria Aparecida Gomes de, & Senem, Cleiton José. (2016). Desenvolvendo habilidades sociais na escola: um relato de experiência. Construção psicopedagógica, 24(25), 84-98. Recuperado em 13 de abril de 2023, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-69542016000100007&lng
=pt&tlng=pt.
MAZZOTA, M.J.S. Trabalho docente e formação dos professores em educação especial. São Paulo: EPU, 2003.
Sassaki, R. K. (2002). Paradigma da Inclusão e suas Implicações Educacionais. Revista Fórum, 38(15), 9-18
Rafaella Faccio Di Nisio
Psicóloga
CRP/ 150239
Thais Lima de Almeida
Acompanhante terapêutica
Quintanista do curso de psicologia